CATANDUVA: Carnaval, ventiladores e pedofilia

Sou de Catanduva. Nasci lá, fui para o Rio e nunca mais voltei. Nunca mais voltei a morar, mas ia lá nas férias, visitar primos e avós.

Depois, adulta, quando falava em Catanduva, as raras pessoas que já tinham ouvido falar de minha cidade, logo diziam: – Ah!!! o melhor carnaval do interior de São Paulo!

Houve um tempo em que falar de Catanduva lembrava que a cidade é ou era a maior produtora de ventiladores do País. Um dia cheguei a ficar orgulhosa ao verificar que um ventilador que eu havia comprado era “made in Catanduva".

Há também os amigos que brincam com o nome da cidade: catando uva... sei lá por que a cidade é chamada assim.

O fato é que, finalmente, Catanduva entrou para as manchetes de jornais. Infelizmente, através de uma triste notícia: Lá existem pedófilos. Uma rede deles abusando de crianças inocentes. Um horror!

Acho bom, embora muito triste, quando essas notícias vêm à tona. Sim, vêm à tona... porque pedofilia e abuso de crianças não são novidade. Mas escondidos sob o manto do medo e da vergonha, muitos adultos de hoje, crianças de ontem, chegam à clinica psicológica com queixas diversas: dificuldades de relacionamento afetivo, dificuldades sexuais, medo generalizado de se relacionar, casamentos e escolhas mal feitas, dificuldade de delimitar seu espaço na família e na vida. No aprofundamento do processo, ou seja, na análise profunda, já decorrido algum tempo de psicoterapia, escondidas no inconsciente, vêm à tona as lembranças... as lembranças da criança abusada!

Não...não pensem que é esse tipo de abuso sexual explícito, com intercurso ou com exposições na internet. Até porque quando os adultos de hoje eram crianças não havia tanta tecnologia que facilitasse nossa vida e a propagação de atos impróprios. Com a tecnologia tudo se potencializa: o bem e o mal! Tudo anda mais rápido. Tudo é agilizado. Mas, no tempo da infância dos adultos de hoje, uma época onde tudo era mais escondido do que é hoje, já existiam, sim, a pedofilia e o abuso de menores.

As lembranças trazem cenas de medo, espanto e prazer... tudo misturado. São cenas noturnas de irmãos mais velhos, primos, tios, cunhados, que sorrateiramente entram no quarto para acariciar a menina, que, assustada, tranca a porta, se esconde, mas não conta nada a ninguém. E não conta porque intuitivamente sabe que o fato desvendado seria motivo de briga, discórdia e até, pasmem, perda do afeto do abusador. São cenas da menina moça, que já passada a época do colo adulto, se deixa seduzir pela sua própria carência de carícias inócuas, submetendo-se inocentemente às carícias erógenas. Ao invés do necessário abraço afetivo, recebe carícias em zonas íntimas, escondidas dos olhos ingênuos da mãe. Quando o abusador é o padrasto ou até mesmo o pai biológico, o medo é ainda maior, pois a sensação de prazer negado se mistura ao sentimento de medo e de traição à mãe. Medo de que a denúncia não seja ouvida. Medo de provocar briga entre os pais.

A notícia de Catanduva é muito triste... mas que a atenção ao mal maior não esconda o que acontece sorrateiramente no silêncio de tantos lares...

Comentários

  1. Prima, realmente este tipo de violência é muito preocupante. Nós da àrea jurídica sabemos da frequencia destes casos.
    Fico muito triste que isto tenha acontecido na nossa cidadezinha. Afinal sempre que me lembro de lá vem as memórias boas.
    Espero que aprendamos com este erro e que o destino de muitas crianças seja alterado por este tipo de discussão.
    Beijo grande

    T. Rocha

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