O FRIO DE BRASÍLIA

Nunca vi Brasília tão fria assim. Fria de temperatura, eu falo. De alma, ela já foi fria um dia, mas agora não é mais.

Frio como esse em Brasília, eu só me lembro quando cheguei aqui, no início dos anos 60. O acontecimento maior dos meses de frio, era a Festa dos Estados - que naquela época era "dos Estados" mesmo - onde se podia comer aquilo do qual se sentia saudade, comidas da terra de cada um, agasalhados com "japona", luva e touca. Os lábios ficavam rachados e as pernas com a pele tão seca, que formavam desenhos com as linhas das rachaduras.

Mas há muito não fazia frio assim por aqui. Era frustrante comprar casacos e botas e guardá-los até mesmo sem usar. Hoje as lojas já sabem - e a gente também - e fazem a liquidação de inverno, antes do outono terminar.

Com a Lei Seca, então, ninguém mais quer sair de casa. O bom é que hoje tem delivery de tudo. Até de sexo, ouvi dizer. É possível pedir de tudo, que o motoboy - coitado - vem depressa trazer.

Quem é solteiro e mora só, convida um amigo ou amiga, namorada ou namorado. Quem chega, já traz o vinho e a desculpa de, por causa da Lei Seca, precisar dormir por lá. Os tradicionais pedem pizza, os sofisticados, Sushi. Enrolam-se nas cobertas, e... tudo pode acontecer!

Os casados, afortunados, nem precisam chamar ninguém. Mandam as crianças pra casa da avó, pedem um DVD, que assistem comendo pipoca e tomando chocolate quente. Se na casa tem lareira, aproveitam a rara oportunidade - se não der preguiça - de acendê-la. Quem não tem lareira, imagina que tem.

As avós ficam felizes com a visita dos netos. E, no meio daquela bagunça gostosa, entre chocolates, bolos, pipoca e tudo o que se tem direito na casa de avó, dormem todos os primos juntinhos, contando os segredos da escola e da vida, sem saber de fato como ela é.

Quem gosta de ficar só, abre um bom vinho, que degusta com queijos e patés, lendo um bom livro, ou fica em frente a TV ou computador. Entra na internet, onde faz amigos do mundo inteiro.

O bom disso tudo, é que parece que Deus, de vez em quando, manda um friozinho gostoso, que é pra gente lembrar que, de qualquer jeito, a gente pode ser sempre feliz!

Comentários

  1. Gostei muito do texto. O seu jeito de escrever reflete vc inteiramente. As recordações da Festa dos Estados são similares às minhas, que datam da mesma época.
    Beijoca e parabéns.
    Jenilda.

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  2. Querida amiga,

    Que texto gostoso de se ler!
    Lembrou-me aquele tempo...
    Beijos
    Cris

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