O “DONO DA VERDADE”

- “Minha irmã é crente!”.
- “Que tipo de crente?”
- “O pior possível”.
- “O pior é aquele que fica tentando convencer a gente!”

Ouvi esta conversa e fiquei com pena dos tais “crentes”... achei que eles deveriam ouvir estas palavras. Por isso a eles e a todas as pessoas que tentam convencer os outros de suas crenças dedico a crônica de hoje.

O que faz uma pessoa querer convencer o outro de que o seu caminho, as suas idéias, as suas crenças são as mais certas?

Sem entrar na questão daqueles que, por motivos inescrupulosos, tentam e conseguem enriquecer, trago aqui algumas reflexões.

Não se aplica somente aos “crentes” evangélicos, mas também aos “crentes políticos”, aos “crentes torcedores de futebol”, aos “crentes intelectuais”, aos “crentes no Deus consumismo” e a todos aqueles que acreditam que o seu grupo, as suas crenças e seus valores são os certos, são os melhores.

O que é melhor? O que é certo? Existe alguma coisa que é certa para todas as pessoas?

Convido-os para uma viagem de desconstrução de pensamentos. Se você se ofendeu com a introdução a esta crônica e seu impulso foi parar de lê-la (o que você não fez se estiver lendo este parágrafo), talvez seja melhor mesmo parar por aqui, pois o que vem adiante é para as pessoas que estão abertas a ouvir. São para as pessoas que acreditam que o outro tenha algo a lhes acrescentar. São para as pessoas que acreditam que não são donas da verdade.

E aqui proponho o primeiro paradoxo: Se você chegou até aqui nesta leitura, demonstra que está aberto a ouvir o outro e, portanto, não se enquadra no grupo que deveria ler esta crônica, pois são justamente aqueles que tentam sempre convencer o outro de que somente eles estão certos em suas idéias, valores e crenças, a quem eu gostaria de dizer estas palavras.

E por que eu me daria ao trabalho de escrever uma crônica para alguém que eu sei que não vai lê-la? Porque eu também estaria convencida de que eu é que estou certa. Segundo paradoxo!

Todos temos nossas idéias próprias, valores e crenças. São crenças adquiridas no decorrer de nossa vida, através dos grupos aos quais pertencemos: a família, a escola, a igreja, os amigos da adolescência, os colegas do trabalho, o time de futebol.

Somos influenciados a participar das idéias do grupo ao qual estamos inseridos, porque esta é a maneira de nos sentirmos incluídos, de nos sentirmos aceitos, nos sentirmos reconhecidos, nos sentirmos amados.

E aí está uma afirmação, penso eu, em que todos concordamos: nós temos a necessidade de sermos amados. Mesmo aqueles que pensam que podem viver sozinhos, sem pertencer a nenhum grupo, pois existe também o grupo das pessoas que não “pertencem a nenhum grupo”. Terceiro paradoxo!

Há pessoas que se isolam, não porque não tenham a necessidade de serem amadas, mas porque, sendo sua necessidade tão grande, o seu temor de serem rejeitadas as impede de correrem o risco de, ao se exporem à situação que lhes possibilitem serem amadas, não se sentirem assim. Ou seja, receberem o golpe fatal ao ver confirmada a sua crença de que não lhes é possível serem merecedoras do amor.

Desta forma, tanto aqueles que tentam convencer os outros de que só eles estão certos, como aqueles que se isolam por medo de serem rejeitados, são pessoas que querem e necessitam desesperadamente de serem amadas.

Só que, tanto umas como outras, acabam sendo rejeitadas. As primeiras porque passam a ser inconvenientes, tentando sempre convencer o outro. As segundas porque, ao se isolarem do grupo, deixam de ter a oportunidade de aprenderem a conviver em grupo.

Concluindo, na minha opinião:

- Os “crentes” “pregam o Evangelho” não necessariamente porque “amam o próximo”;
- Os políticos nem sempre querem vencer as eleições para fazer o melhor pelo povo;
- Os intelectuais nem sempre querem convencer o outro com o objetivo de contribuir para a construção e compartilhamento do conhecimento;
- Os torcedores de futebol nem sempre estão convencidos de que os seus times realmente são os melhores;
- Os que consomem produtos de marca nem sempre o fazem por acreditarem que aqueles são os produtos de melhor qualidade.

Mas todos eles desejam profundamente serem amados, através do reconhecimento do grupo ao qual pertencem.

Mas isto também pode ser questionado, pois, afinal, eu também não sou dona da verdade!

Obrigada por ler esta crônica! Como todas as pessoas, inclusive você, eu também tenho necessidade de ser ouvida, de ser reconhecida, de ser amada!


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